1 de ago. de 2011

O menino e o mundo




Essa é a história do menino que tinha o mundo. Um dia ele pintou os olhos, colocou um chapéu e ganhou o mundo.

22 de jul. de 2011

Para apagar





Sim, de novo e mais uma vez, tento encher as mãos com qualquer coisa, só pela segurança de não me soltar de um porto que só é seguro dentro desse quarteirão. Se me perguntar, te digo com convicção que sei muito bem do que me carrego e de que não abandono. Presa no meio dessa neblina que já não me parece mais tão fria, te procuro atrás de sombras que eu mesma pinto nas esquinas. E pela primeira vez, sinto como se não conhecesse nada, nenhuma dessas calçadas que tanto andamos, dessas ruas que tanto corremos, desses bancos que muitas vezes não sentamos, mas pensamos em como seria bom ficar ali, só olhando os carros que passam e vão pra sabe-se lá aonde.
Assim sinto esse medo de qualquer coisa desconhecida tomando conta de tudo que tenho, esse medo de não saber mais quem é você, ou quem sou eu, medo mesmo de não saber onde está nosso começo e com isso tentar achar o fim das coisas, apenas por achar, e saber que esta ali.
Se sei de você, sei que é livre, e isso é tudo. Assim procuro mais um drink barato, apago meu cigarro, e espero te encontrar no próximo poste, ou quem sabe no seguinte.

7 de jun. de 2011

Roda Gigante



Pra cada piscar de olhos, a certeza de uma noite mal dormida. O inevitável ocilar entre toda a negritude do seus próprios delirios e a graciosidade daquela pele, rosada por causa do frio. Essa era a infinita viagem entrem abrir e fechar os olhos naquela noite. Mas, o que ela podia esperar? Tinha abrigado todas as suas esperanças em um castelo de areia. Aquela qualquer coisa crua de um sentimento infatil meio natimorto foi esquecido em meio à tantas tempestades de vento. Que agora, mesmo impalpavél insiste em se fazer presente.
Pouco a pouco, como quem come sem fome, ela se entrega sem desejo. “Um, dois, três”. Ela conta, ela pensa, mas não calcula, é assim que ela mergulha, novamente de olhos bem fechados, na imensidão de todas as suas dúvidas. Como se anestesiada pela falta de talento do momento, pudesse ser perdoada pelas falhas do passado.
Levanta então o rosto, inundado de tormentos, na esperança de um gesto qualquer, que diga sim, ou ao menos talvez. Ilusão. Se engana conciente, e faz que está bem. Seu deus a pega pela cintura, ela sorri. Está feliz entre aqueles braços, e tudo recomeça, pela terceira ou quarta vez.

4 de jun. de 2011

Pra dizer até logo



No meio da densa fumaça que sempre o cerca, ele temeroso segura seu cigarro, com os dedos cheios de anéis, a ponta das unhas amareladas, esboçando um francês pré ensaiado e um pouco ameaçador. Ele não para, o frenesi faz parte do seu ser. É estranho pensar que assim ele me tranquiliza.
Ele não vê como eu vejo, não sei se pela obrigação imposta pelas suas lentes, ou pela dor que o acompanha escondida atraz de uma Lomo amadeirada. Gosto de pensar nele como um cigano, desses que as vezes assustam a gente na rua. Ele bebe, ele grita, chora e estranha. É como se por dentro ele balançasse entre o ter e o não ter um coração. Sua fuga é a noite, onde ele tem certeza de todas as guias, todos os bares e nunca se cansará de olhar pra cima na esperança sempre frustrada de encontrar uma estrela.
Quando vejo ele, se misturando com as luzes da rua, meio ocre, olhando atravez do copo de cerveja, sei que ali ele pode amar. Ciganos não têm permissão para amarem em qualquer situação. Então ele só ama quando está anestesiado. E eu queria segurar ele pelas mãos, e dar uma volta por aquelas ruas que já são dele. Queria poder mostrar que aqui a gente não tem estrelas, mas que se tivessemos, elas desceriam até aquela esquina, pra brindar o amor dele. Que todas as coisas do mundo esperam anciosamente pelo dia em que ele as irá olhar, e registrar, e pensar nelas. Eu espero por esse dia também.
Queria dizer que o amo. Queria pedir pra ele ficar. Mas virei meu copo, com qualquer bebida doce demais pro meu espirito, deixei uma lágrima pingar na mesa, e fui embora, sentindo um cheiro nauseante de qualquer coisas misturada com dor.

11 de mai. de 2011

Falta Intensidade



Ele quis saber o por quê desse gosto. Eu que sempre fui mais de roer as unhas e menos de buscar um por que nas coisas, dizer-lhe-ia que era só porque gosto. Gosto assim, é como o gosto de café na boca, mas era o gosto dele em mim. Estava tudo bem, porque estava tudo simples. Confusa no meio da fumaça e das cinzas caidas de um cigarro barato, me obrigo a equacionar sensações. Colocando aquele sorriso na minha frente e somando ao cheiro do Marlboro ou aquele RayBan anos 50. Não chego a lugar algum.
As vezes penso que é tudo sobre voar ou não ter casa, andar descalça e enrolar o cabelo. E ele me diz que essas coisas acabam, que a gente cresce e deixa de sentir. Já começo a acreditar que é sobre medo, toda essa coisa de gostar, só pode se explicar quando uma mão fria é capaz de fazer tremer um coração.
É como se todos os orixás me cobrassem a alma para provar que acredito em um amor intocado. E mesmo que conhecesse o que isso quer dizer tudo continuaria igual. Falta intensidade, falta um pouco dele e um pouco de mim. Esse sem amor só de gostar faz isso com as pessoas.

13 de abr. de 2011

Auto-Retrato de uma Quarta-Feira



Com a cabeça meio deitada na janela, ela vê metade cinza, metade neon. Um, dois, cinco, doze... são muitos os prédios naquela avenida. Respira e nota que nada mudou, a janela da frente continua quebrada, algum alarme continua tocando. Mais um copo foi quebrado no bar da esquina e uma cirene de policia ou de bandido passa por ela.
Já perdeu a conta de quantos bêbados cantaram canções de amor enquanto procura em vão uma estrela no céu. Só aviões, indo pra qualquer outro lugar, fugindo dela. A fumaça dos seus cigarros irrita seus olhos, respira e tosse. Enrola o cabelo. Nunca deixará de roer as unhas.
Faz um pouco de frio, o vento vem dizer que ela não arrumou o cabelo da forma como deveria. O vizinho da frente parece nunca se cansar de pornografia, mas o que ela pode fazer? Ela mesma nunca se cansa de sonhar.

11 de abr. de 2011

Meu Presente



Meio que pela metade ela faz que se mostra, se faz sorrir. Mas é tudo só a metade. Ela sempre foi assim, de um lado o branco, do outro o preto, agridoce ao falar. É dessas meninas que sabem amar e quando de olhos fechados também sabem viver. É o que ela faz pra ser feliz, sabe das coisas, sabe fazer sorrir. Mas isso é tudo só a metade.
Se ela soubesse que quando tem os olhos borrados já não sabe mais ser metade... Assim, de cigarro na mão, rosto meio baixo, meio longe. Ela é duas, e se faz amar.
E que amor é esse que ela busca em cada passo? Que encontra em poucos olhares, que a sufoca de coisas sem nome. Ai, mas ela sabe o que é amar. Faz tremer ao tocar, inebria ao olhar.
A frieza de suas mãos não sairão tão cedo da minha pele. E assim a tenho em memória, alegrando-me toda vez que escuto um "Bom Dia" inocente pela rua.

31 de mar. de 2011

Silenciosa


Assim com lábios pintados de vinho, as mãos presas ao nada e aquele mesmo cheiro de uisque, sempre com gelo. O cigarro apagado, o copo vazio, nenhum novo amor. E é assim que ela é.

11 de fev. de 2011

TunTunTá



Pela primeira vez me vi diante de tanta beleza. Não como se pode dizer da maneira convencional. Mas quando um tipo de malemolência sinestésica te faz balançar entre o ontem e o hoje. Diante dos meus olhos vi você. Você, seus cabelos molhados, o azulejo velho do banheiro. Vi, mas nada disso existia hoje.
As lembranças do nosso velho banheiro. Do vidro quebrado, das paredes mofadas. A lembrança dos seus olhos tristes, do seu riso forçado. Sua pele toda de uma tez clara, uniforme. A água fria que descia negra pelos seus cabelos. Lábios arroxeados. Rejunte com bolor. Frio.
Essa lembrança inebriante se fixou diante de mim, gritou pra mim, me fez prever um passado que nunca existiu. Eu amei seu esmalte descascado. Pelo menos teria amado se soubesse que disso dependiam todas as manhãs seguintes.
Dentro de mim senti um leve perder dos sentidos, pendi. Senti um leve perder de você. T-T-T-T-T. Você repete no meu ouvido direito antes de se enxugar. T-T-T-T-T. Sua canção favorita. T-T-T-T. Seu cabelo no meu ombro. Agora não me lembro, se foi uma gota, ou uma lagrima que mergulhou no meu colo. T-T-T, assim meio que morrendo entre esse e aquele suspiro.
Procurei respostas pra perguntas que eu nem ao menos tinha formulado. Procurei deseperadamente por você naquelas vozes abafadas. Nas minhas memórias de madrugas frias. Nas peles quentes. Na água dura. Todas elas. A sua canção favorita era um jazz improvisado, era uma carta de adeus.

25 de jan. de 2011

Analgésicos e Baratas



E já eram tantas iguais aquela noite. Tantas ruas igualmente vazias. Tantas moças igualmente embriagadas. Tantos cigarros abandonados ainda pela metade. Assim era ela. Igual a tantas. Fazia o mesmo esforço de qualquer sábado à noite: equilibrar-se no salto, desviar dos mendigos, não derrubar a última cerveja e por fim, entrar na casa certa. Se mantinha seriamente concentrada nesta equação. Não sabia sequer pronunciar o nome daquela rua. Sua pele mudava de tom conforme se afastava de cada poste, da iluminação pública. Seu humor ocilava entre o terracota e amarelo ocre. Sentia mesmo que fazia parte daquele lugar. Como se súbito algo lhe arrematasse os sentidos. Sempre fora ignóbil, lasciva e até um pouco selvagem. Mas como que se dando conta de que ainda segurava uma mão, que tremia mesmo perante tamanho calor; apertando forte aquela mão, sentiu que não podia mais. Parou, tirou os sapatos. Vacilou. Acendeu mais um cigarro:

-Te levo pra casa. (Sou diferente, porra.)
-Não precisa. (Me desculpe.)
-Tudo bem, quero andar mesmo. (Eu te amo.)
-Tá. (És uma fraca de merda, isso que tu és.)

Ela nunca soube se era tão diferente quanto pensava. Seus lábios tingidos de rosa não lhe pareciam muito incomum. Até seu vestido todo puído não se destacava perante as poucas sombras andantes daquele lugar. Seu passo trôpego, seu cabelo desgrenhado, suas unhas roídas. Ostentava um enorme orgulho em ser absurdamente pertencente aquela paisagem. Mesmo sem ouvir qualquer palavra daquela despedida, sabia que no fundo, ele também pertencera aquela podridão. Ele também pertencera a ela. Mas esses tipos de moças não se deixam possuir. Por isso tomam aspirinas pela manhã, e esquecem-se de rostos, mãos, dívidas e jogos. Antes de entrar em casa, ela simplesmente nota que já é de manhã, e perdeu os sapatos no caminho. Quanto a ele, já nem se lembra mais da garota, que neste exato momento tranca os portões querendo que ele a siga vida a dentro.