25 de fev. de 2010

Medo de Dormir

Xícaras e mais xícaras de café, sujas e espalhadas pela casa. Algumas ainda pela metade, mas com o amargo remédio já frio. Remédio. Era assim, para curar o fim do dia. Aceitar o ínicio da noite era como aceitar o fim das coisas. Então se negava, não se entregava. Era medo. Só medo. Medo do amanhã que não é hoje, e do hoje que não pode simplesmente ir embora, sem nem dizer "até logo".
Ai, como era torturante vê-la assim. Olhos fundos, ossos fracos. Pensando e só. Já nem sabia no que pensar. Inventava fantasmas embaixo da cama. Inventava amores ao lado da cama, afogada na interminavel madrugada. Para ela ainda era dia.
Temia a escuridão, e com razão. Era cega de emoções, já não podia mais enxergar no escuro. Sentia e pensava. E assim não vivia. Quem pensa muito não tem tempo para viver.
Mais um ou dois cafés e ela esqueceria.

17 de fev. de 2010

Minha Estante

A clareza dos sentidos não significava nada. Talvez aprendesse isso, mas cedo ou mais tarde, com Woolf ou Lispector. De resto, só sabia que amava, sem poder, sem mais.
Era assim.
Agora era feliz. Sentada em sua cadeira, dentro daquele cômodo minúsculo que cheirava a madeira e bolor. Acompanhada? Sim, sempre com Brontë e seus pensamentos.
"Ela se fora". Simplesmente, se fora. Como um grito. Em um curto espaço de tempo.
Talvez as pessoas fossem assim mesmo. Amassem na ausência, e dela faziam a felicidade

9 de fev. de 2010

Em Cima do Parapeito

Imune ao mundo, como se ela tivesse anti-corpos que a defendiam da humanidade.
Era assim, sentada no parapeito, olhando para aquele céu sem estrelas.
Fria, quase morta.
Conforme seu coração ia secando, ela ia sentindo um pouco de dor.
Mas só um pouco.

5 de fev. de 2010

Sobre Asas e Medos

Ele sabia voar. Se quisesse, cruzaria o oceano batendo aquelas grandes asas. Voaria para perto do sol, por cima do mar e por entre as nuvens.
Sim, ele sabia voar. Aprendera quando ainda menino, porque não tinha medo. Crianças são assim, meninos são super-heróis.
Mesmo sem capa e super-poderes, ele ainda era um super-menino. Nunca crescera, e por isso ainda sabia sorrir. Se hoje andava triste, era por não saber que sabia. Sabia voar. Só não sabia que suas asas não eram de cera. Como um menino já não devia ter medo.
Mas que tipo de adulto é capaz de acreditar em super-asas, e de olhos fechados sair voando? Talvez ele tivesse dúvidas, pois mesmo sendo um super-menino, já deixara a inocência das crianças há muito tempo. Gostava de fingir-se de menino. Fingia não para os outros, mas para ele mesmo.
E era bonito quando sorria feito criança. Mostrava os dentes, fechava os olhos, e só então, voava.

2 de fev. de 2010

Felicidade Negra

Sob o céu negro, ela vinha com cabelo rente a nuca. Descalça, de pé no concreto, como gostava de andar. Trazia em uma das mãos um cigarro apagado, e na outra a Felicidade.
Essa tal Felicidade teve a ideia de tomar banho chuva. Porque ela era assim. Dada a liberdades. Cheia de vontades de mãos entrelaçadas, e livres ao mesmo tempo.
Era aquela outra, negra feito a noite, que lhe dava o nome exibido com graça em um sorriso, as vezes, gargalhada.
Sem dizer uma só palavra, a negra olhava para o céu, deixava chover em seus olhos, e agradecia pela noite parecer infinita.